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Neoclassicismo

[Neoclassicismo] * [Arcádia Lusitana] * [Princípios gerais estéticos do Arcadismo] * [Iluminismo] * [Crítica ao Barroco]

Neoclassicismo



Movimento literário, derivado do espírito crítico do Iluminismo, que visa à reabilitação e restauração dos géneros, das formas, das técnicas e da expressão clássicas, que vingaram em Portugal no séc. XVI. Esta renovação faz-se acompanhar duma severa disciplina estética e dum purismo estreme, que procura libertar a língua de termos espúrios, restituindo-lhe uma sobriedade castiça e o rigor de sentido. Os primeiros indícios deste interesse por problemas de preceptiva literária e linguística aparecem logo no limiar do séc. XVII e vão-se acentuando progressivamente até ganharem a força de uma corrente contra os excessos e exageros do barroco, no séc. XVIII. (...) O Neoclassicismo vai atuar, portanto, em dois sectores capitais: o da doutrinação estética e o da criação literária. O primeiro é fortemente orientado pelo racionalismo mecanicista, evidenciado no VERDADEIRO MÉTODO DE ESTUDAR (1746) de Verney e, por ex., nas ENFERMIDADES DA LÍNGUA PORTUGUESA (1759) de Manuel José de Paiva.

(...) O mais documentado teórico do movimento foi, porém, Francisco José Freire, «Cândido Lusitano» (1719-1773), que elaborou uma ARTE POÉTICA (1748) e ainda um DICIONÁRIO POÉTICO (1765) e REFLEXÕES SOBRE A LÍNGUA PORTGUESA (1842). (...) A revalidação crítica das letras nacionais prossegue vivamente por todo o séc. XVIII, sob o signo do neoclassicismo, e é apoiada por uma vaga de traduções de autores greco-latinos, particularmente os latinos, sendo de realçar, entre mais de dez versões da ARTE POÉTICA de Horácio, as que foram feitas por Francisco José Freire e pelo Dr. Lima Leitão. (...) Ora deste vasto mar de teorias é possível fazer uma rapidíssima síntese das normas estéticas que enformam o neoclassicismo:

Com uma estrutura complexa, com decoração rocaille, este

palácio apresenta fachadas ao gosto neoclássico, como é o

exemplo da colunata de balaustradas.


a) condenação do barroco nas suas formas de cultismo e concetismo;
b) a Arte deve ser concebida como imitação da natureza (Aristóteles);
c) a rima deve ser abolida (Garção e, na sua peugada, Filinto) por constituir uma constrição para o pensamento e para o verso;
d) toda a literatura obedece a um fim ético e moral e a forma deve manter perfeita harmonia de valores verbais e o equilíbrio entre a razão e o sentimento.

O poderoso agente institucional da formação e fixação do gosto neoclássico foi a ARCÁDIA LUSITANA ou OLISSIPONENSE, fundada em 1757. Todavia no domínio da criação literária nem sempre a posição teórica do arcadismo é devidamente respeitada. É o que sucede com o receituário mitológico, condenado por Verney e Cândido Lusitano, e a que Cruz e Silva recorreu. (...)

Rebelo, Luís de Sousa, DICIONÁRIO DE LITERATURA, 3ª edição, 3º volume


Arcádia Lusitana



Agremiação ideada em 1756 e fundada no ano seguinte pelos esforços de António Dinis da Cruz e Silva, Manuel Esteves Negrão e Teotónio Gomes de Carvalho, o primeiro dos quais se encarregou de lhe dar os estatutos por que se regeu. Tratava-se duma agremiação um tanto semelhante às academias de literatos que tinham proliferado em Portugal no século anterior, e, como elas, também para apresentação das produções dos seus sócios e sua crítica, mas com uma orientação literária antagónica à daquelas, porquanto, ao passo que essas promoviam o desenvolvimento do barroquismo seiscentista, esta procurava combatê-lo, seguindo algum tanto as lições dos iluministas portugueses da primeira metade do século XVIII. Era sua divisa Inutlia truncat, significando inutlia (coisas inúteis) tudo aquilo que o critério novo considerava atentatório do bom gosto e dum programa neoclassicista a que se comprometiam os seus sócios. Para levar a efeito estes propósitos, a Arcádia incluía entre a sua atividade não só a apreciação, segundo normas de censura muito precisas, das composições apresentadas, como ainda a discussão de teses de teoria literária comunicadas sob forma de dissertação por alguns dos seus orientadores.
Teatro  D. Maria II Casa de Garrett
Edifício ecléctico, mas com predomínio da arte neoclássica.
Do grupo dos sócios fizeram parte os principais poetas desse período: além de Cruz e Silva, P A Correia Carção e Domingos dos Reis Quita, um polígrafo do didaticismo, Francisco José Freire, e um dramaturgo, Manuel de Figueiredo, dos quais chegaram até nós, além das respectivas composições artísticas, algumas das teses que aí teriam defendido. (...) Da análise das obras que deixaram e das afirmações de teoria que fizeram, conclui-se que, no seu combate ao barroquismo seiscentista, procuravam uma conciliação entre um regresso às primitivas normas do classicismo (observação das técnicas nos modelos legados pela Antiguidade ou nos modernos que bem as tivessem observado) e a orientação racionalista do teorizador francês Boileau e outros da linha aberta por ele, como certos outros franceses, o italiano Muratori, o espanhol Luzán, etc. Deste modo, há entre os Árcades uma tendência para aceitar deles um critério de utilidade na avaliação da obra literária (aspecto que tinha escapado à teorização de Verney); para determinar alguma limitação à imitação dos clássicos, considerando sem razão e sem bom gosto a que denominavam servil; para a adopção duma maior liberdade de movimentos na criação poética pela libertação da rima. Entretanto, mostram-se ainda demasiadamente presos a preconceitos de géneros quanto a pormenores de construção teatral ou a questões de estilo, - manifestando-se já neles a preocupação, que há-de vir a ter mais tarde uma grande preponderância, dos aspectos filológicos da expressão artística. - Não foi muito duradoura, ou pelo menos sem incidentes, a vida desta agremiação. A um período de atividade entusiástica que vai de 1757 a cerca de 1760, seguiram-se períodos entrecortados de vicissitudes várias (afastamento dos sócios mais devotados, questões internas, ataque de literatos dissidentes, etc.), durante os quais a sua função se vai desvirtuando e caindo em franca dissolução, até seu desaparecimento por 1774.

(Saraiva, António José, DICIONÁRIO DE LITERATURA, 3ª edição, 1º volume)

Princípios gerais estéticos do Arcadismo


    1. Condenação absoluta do cultismo e do conceptismo.

    2. Aceitação do conceito aristotélico da Arte (a Arte é imitação da Natureza).

    3. Sentido de equilíbrio e proporção na obra literária.

    4. Exposição simples e natural dos assuntos, evitando perífrases e chamando às coisas pelo seu nome.

    5. Necessidade da imitação dos antigos, mas só no que têm de bom. Prestou-se culto especial a Homero, Píndaro, Sófocles, Eurípedes e Aristófanes; a Horácio, Virgílio e Terêncio; a Camões, Ferreira e Diogo Bernardes.

    6. Condenação da rima.

    7. Aceitação da crítica construtiva como se fora um conselho amigo. A crítica era instituição oficial da Arcádia. Para a fazer, elegiam-se dois censores e dois árbitros.

    8. Reconhecimento da finalidade morigeradora da obra literária.

Barreiros, António José, HISTÓRIA DA LITERATURA PORTUGUESA, 14ª edição, vol. 1

Iluminismo


Pela palavra ILUMINISMO designa-se um esforço de renovação cultural, de natureza sobretudo política, realizado no curso do séc. XVIII, que tinha em vista, por uma atualização de conceitos, de normas e de técnicas, uma maior eficiência na ordem social, e se subordinava à conceção nova do progresso humano. A designação provinha, como é óbvio, do significado de iluminação como esclarecimento, e com isto se prende a designação daquele século como o das luzes. Os fomentadores desse esforço foram, consequentemente, os iluministas. O seu aparecimento tem raízes na renovação filosófica operada pelo racionalismo cartesiano, pelo experimentalismo baconiano, pelo fisicismo newtoniano, pelo sensorismo lockiano, etc., por um lado; por outro, tem-nas na obra dos renovadores da ciência jurídica, sobretudo nos construtores do direito das gentes (Puffendorf), etc.). A confiança que o Iluminismo teve nas bases em que assentou era afinal o resultado a que se chegara numa discussão célebre, a da QUERELLE DES ANCIENS ET DES MODERNES, quando vingou a ideia da supremacia da cultura moderna sobre a dos antigos, pela conclusão de que eram os modernos os depositários das experiências milenárias, enriquecidas pelas experiências recentíssimas. Os iluministas foram os que procuraram a aplicação para essa soma de tanta experiência.

Júnior, António Salgado, DICIONÁRIO DE LITERATURA, 3ª edição, 2º volume

Crítica à poética cultista e concetista


Quando vejo um poeta destes, que se serve de expressões que nada significam, ou que compõem de sorte que o não entendem, assento que não quis ser entendido, e, em tal caso, procuro fazer-lhe a vontade, e não o leio. Com esta sorte de homens faço o mesmo que com os labirintos e enigmas, etc., os quais nunca me cansei de decifrar. Eles que o fazem, que se divirtam com isso. Se todos assentassem neste princípio, veria V. P. como se mudava a poesia nestes países; porque seriam obrigados os poetas a lerem somente as suas obras; e, assim, ou se desenganariam eles mesmos com o tempo, ou não enganariam os outros; e poder-se-iam achar poetas de algum merecimento; principalmente se chegassem a conhecer quais são os requisitos necessários para a poesia. A razão destes inconvenientes é porque se persuadem comummente que, para ser poeta, basta saber a medida de quatro versos e saber engenhar conceitos esquisitos. Quem se funda nisto não pode saber nada: são necessárias muitas outras notícias. É necessário doutrina e entender bem as matérias que se tratam; é necessária a Filosofia, e saber conhecer bem as ações dos homens, as suas paixões, o seu carácter, para as saber imitar, excitar e adormecer.. Aqui entra novamente a Retórica, que supõe todas aquelas coisas; entra uma pouca de história, para não dizer parvoíces; entra a história da fábula, etc. Tudo isto se mostra manifestamente nos melhores poemas que temos da Antiguidade. (...) Onde, quem não tem estes fundamentos é versejador, mas não poeta; e necessariamente há-de dizer muita parvoíce.

Verney, Luís António (1713-1791), VERDADEIRO MÉTODO DE ESTUDAR, Carta VII

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