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Decadentismo




Esta palavra designa uma corrente literária que se manifesta principalmente depois de 1880 e se prolonga, em Portugal, até à década de 1920. Liga-se ao cansaço duma civilização que se julga estar no ocaso, ao tédio, à busca de sensações novas, mais intensas, fruídas no extravagante, no mórbido, nos requintes da forma. Trata-se, pois, dum esteticismo que tem estreitas relações com o simbolismo e o impressionismo, produtos da mesma atmosfera sócio-cultural. Usa-se o adjetivo decadente no sentido de decadentista (ou decadista), daí a frase de Álvaro de Campos numa carta inserta na revista Contemporânea em 1922 (n. 4): «Fui em tempos poeta decadente (alusão ao «Opiário»); hoje creio que estou decadente, e já o não sou». [...] Com efeito, em poetas portugueses influenciados por Baudelaire já antes de 1880 se descobre uma tendência decadentista [...] o artista decadente sucumbia à sedução do antivital por sentir exausta a força criadora; evadia-se para o mundo da imaginação sensual, entretinha a nevrose com fantasias deliquescentes e preciosismos fúteis. Em fins do século XIX o termo decadência ocorre a cada passo. Osório de Castro fala em 1889 do «isolamento altivo dos artistas deste século que morre»; Raul Brandão, que pertence, por 1891-2, ao «Cenáculo» portuense dos «nefelibatas» (com Alberto de Oliveira, D. João de Castro, António Nobre, etc.), dá-nos na História dum Palhaço (1896) a imagem duma época em que, perdidas a fé cristã e a fé na ciência, «a asa do sonho outra vez toca os espíritos» e em que nascem «criaturas singulares, aberrações infinitas, curiosos cérebros cheios de sonho»; também ele reconhece «a agonia do século». O simbolismo de Eugénio de Castro tem muito de decadentista, pela estranheza dos motivos, neologismos, palavras raras e combinações fónicas; o decorativo da liturgia, a «medievalite», a evocação luxuosa de ambientes orientais, a sensualidade perversa de Salomé - eis outros aspetos característicos. [...] O livro Degenerescência de Max Nordau, vertido em francês em 1893-4, impressionou muitos espíritos, entre os quais o de Fernando Pessoa; na época do Orpheu (1915), tanto este como Luís de Montalvor enfileiram no decadentismo e elaboram teorias da decadência. «Temos a decadência proveniente da falência de todos os ideais passados e mesmo recentes - escreve Pessoa. Temos a intensidade, a febre, a atividade turbulenta da vida moderna. Temos, finalmente, a riqueza inédita de emoções, de ideias, de febres e de delírios que a Hora europeia nos traz». As desilusões da vida política portuguesa, já nos últimos tempos da monarquia, já nos primeiros tempos da república, haviam de contribuir, no caso português, para o pessimismo em que o decadentismo desabrocha. Em 1916, Montalvor, poeta mallarmista-decadentista, começa deste modo a «Tentativa dum ensaio sobre a decadência» (in Centauro, n. 1): «Somos os decadentes do século da Decadência. Vamos esculpindo a nossa arte na nossa indiferença. A vida não vale pelo que é mas pelo que dói... Só a Beleza nos interessa... Se nos apelidamos ou nos apelidaram caracteristicamente de decadentes é porque temos um sentido próprio de decadência». [...]
Coelho, Jacinto do Prado, DICIONÁRIO DE LITERATURA, 3.ª edição, 1.º volume, Porto, Figueirinhas, 1979

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