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Nota: estes sonetos contêm Linhas de Leitura de Manuel
Maria.
Magro,
de
olhos azuis, carão moreno
Magro,
de olhos azuis, carão moreno,
Bem servido de pés, meão na altura,
Triste de facha, o mesmo de figura,
Nariz alto no meio, e não pequeno;
Incapaz
de assistir num só terreno,
Mais propenso ao furor do que à ternura,
Bebendo em níveas, por taça escura,
De zelos infernais letal veneno;
Devoto
incensador de mil deidades
(Digo, de moças mil) num só momento,
E somente no altar amando os frades;
Eis
Bocage em quem luz algum talento;
Saíram dele mesmo estas verdades,
Num dia em que se achou mais pachorrento.
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Apenas vi do dia
a luz brilhante
Apenas
vi do dia a luz brilhante
Lá de Túbal no empório celebrado,
Em sanguíneo carácter foi marcado
Pelos Destinos meu primeiro instante.
Aos
dois lustros a morte devorante
Me roubou, terna mãe, teu doce agrado;
Segui Marte depois, e enfim meu fado,
Dos irmãos e do pai me pôs distante.
Vagando
a curva terra, o mar profundo,
Longe da Pátria, longe da ventura,
Minhas faces com lágrimas inundo.
E
enquanto insana multidão procura
Essas quimeras, esses bens do mundo,
Suspiro pela paz da sepultura.
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Olha,
Marília, as flautas dos pastores
Olha,
Marília, as flautas dos pastores
Que bem que soam, como estão cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha, não sentes
Os Zéfiros brincar por entre as flores?
Vê
como ali beijando-se os Amores
Incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes,
As vagas borboletas de mil cores.
Naquele
arbusto o rouxinol suspira,
Ora nas folhas a abelhinha pára,
Ora nos ares sussurrando gira.
Que
alegre campo! Que manhã tão clara!
Mas ah! Tudo o que vês, se eu não te vira,
Mais tristeza que a noite me causara.
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Importuna
Razão, não me persigas
Importuna
Razão, não me persigas;
Cesse a ríspida voz que em vão murmura;
Se a lei de Amor, se a força da ternura
Nem domas, nem contrastas, nem mitigas;
Se
acusas os mortais, e os não abrigas,
Se (conhecendo o mal) não dás a cura,
Deixa-me apreciar minha loucura,
Importuna Razão, não me persigas.
É
teu fim, teu projecto encher de pejo
Esta alma, frágil vítima daquela
Que, injusta e vária, noutros laços vejo.
Queres
que fuja de Marília bela,
Que a maldiga, a desdenhe; e o meu desejo
É carpir, delirar, morrer por ela.
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Sobre
estas duras, cavernosas fragas
Sobre
estas duras, cavernosas fragas,
Que o marinho furor vai carcomendo,
Me estão negras paixões n'alma fervendo
Como fervem no pego as crespas vagas;
Razão
feroz, o coração me indagas.
De meus erros a sombra esclarecendo,
E vás nele (ai de mim!) palpando, e vendo
De agudas ânsias venenosas chagas.
Cego
a meus males, surdo a teu reclamo,
Mil objectos de horror co'a ideia eu corro,
Solto gemidos, lágrimas derramo.
Razão,
de que me serve o teu socorro?
Mandas-me não amar, eu ardo, eu amo;
Dizes-me que sossegue, eu peno, eu morro.
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A
frouxidão no amor é uma ofensa
A
frouxidão no amor é uma ofensa,
Ofensa que se eleva a grau supremo;
Paixão requer paixão, fervor e extremo;
Com extremo e fervor se recompensa.
Vê
qual sou, vê qual és, vê que diferença!
Eu descoro, eu praguejo, eu ardo, eu gemo;
Eu choro, eu desespero, eu clamo, eu tremo;
Em sombras a razão se me condensa.
Tu
só tens gratidão, só tens brandura,
E antes que um coração pouco amoroso
Quisera ver-te uma alma ingrata e dura.
Talvez
me enfadaria aspecto iroso,
Mas de teu peito a lânguida ternura
Tem-me cativo e não me faz ditoso.
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Liberdade,
onde estás? Quem te demora
Liberdade,
onde estás? Quem te demora?
Quem faz que o teu influxo em nós não Caia?
Porque (triste de mim!) porque não raia
Já na esfera de Lísia a tua aurora?
Da
santa redenção é vinda a hora
A esta parte do mundo que desmaia.
Oh! Venha... Oh! Venha, e trémulo descaia
Despotismo feroz, que nos devora!
Eia!
Acode ao mortal, que, frio e mudo,
Oculta o pátrio amor, torce a vontade,
E em fingir, por temor, empenha estudo.
Movam
nossos grilhões tua piedade;
Nosso númen tu és, e glória, e tudo,
Mãe do génio e prazer, oh Liberdade!
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Liberdade querida e
suspirada
Liberdade querida e suspirada,
Que o Despotismo acérrimo condena;
Liberdade, a meus olhos mais serena,
Que o sereno clarão da madrugada!
Atende à minha voz, que geme e brada
Por ver-te, por gozar-te a face amena;
Liberdade gentil, desterra a pena
Em que esta alma infeliz jaz sepultada;
Vem, oh deusa imortal, vem, maravilha,
Vem, oh consolação da humanidade,
Cujo semblante mais que os astros brilha;
Vem, solta-me o grilhão da adversidade;
Dos céus descende, pois dos Céus és filha,
Mãe dos prazeres, doce Liberdade!
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Oh retrato da
Morte, oh Noite amiga
Oh
retrato da Morte, oh Noite amiga,
Por cuja escuridão suspiro há tanto!
Calada testemunha de meu pranto,
De meus desgostos secretária antiga!
Pois
manda Amor que a ti somente os diga,
Dá-lhes pio agasalho no teu manto;
Ouve-os, como costumas, ouve, enquanto
Dorme a cruel, que a delirar me obriga.
E
vós, oh cortesãos da escuridade,
Fantasmas vagos, mochos piadores,
Inimigos, como eu, da claridade!
Em
bandos acudi aos meus clamores;
Quero a vossa medonha sociedade,
Quero fartar meu coração de horrores.
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Já sobre o coche de ébano estrelado
Já sobre o coche de ébano estrelado
Deu meio giro a Noite escura e feia;
Que profundo silêncio me rodeia
Neste deserto bosque à luz vedado!
Jaz entre a folhas Zéfiro abafado,
O Tejo adormeceu na lisa areia;
Nem o mavioso rouxinol gorgeia,
Nem pia o mocho, às trevas costumado.
Só eu velo, só eu, pedindo à Sorte
Que o fio, com que está minha alma presa
À vil matéria lânguida, me corte.
Consola-me este terror, esta tristeza,
Porque a meus olhos se afigura a Morte
No silêncio total da Natureza.
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Meu
ser evaporei na lida insana
Meu
ser evaporei na lida insana
Do tropel de paixões, que me arrastava;
Ah! cego eu cria, ah! mísero eu sonhava
Em mim quase imortal a essência humana.
De
que inúmeros sóis a mente ufana
Existência falaz me não dourava!
Mas eis sucumbe a Natureza escrava
Ao mal, que a vida em sua orgia dana.
Prazeres,
sócios meus, e meus tiranos!
Esta alma, que sedenta em si não coube,
No abismo vos sumiu dos desenganos.
Deus,
oh Deus!... Quando a morte à luz me roube,
Ganhe um momento o que perderam anos,
Saiba morrer o que viver não soube.
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Já Bocage não sou!... À cova
escura
Já Bocage não sou!... À cova escura
Meu estro vai parar desfeito em vento...
Eu aos Céus ultrajei! O meu tormento
Leve me torne sempre a terra dura.
Conheço agora já quão vã figura
Em prosa e verso fez meu louco intento;
Musa!... Tivera algum merecimento
Se um raio de razão seguisse pura!
Eu me arrependo; a língua quase fria
Brade em alto pregão à mocidade,
Que atrás do som fantástico corria.
Outro Aretino fui... A santidade
Manchei - ... Oh! Se me creste, gente ímpia,
Rasga meus versos, crê na eternidade!
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de Leitura
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Linhas de Leitura
Magro, de olhos azuis, carão moreno
-
Estrutura interna bipartida:
- 1ª parte,
constituída pelas quadras e pelo 1º terceto,
na qual o sujeito poético esboça o seu
auto-retrato;
- 2ª parte,
constituída pelo último terceto, na qual o
sujeito poético revela a sua identidade e as
circunstâncias que proporcionaram a criação do
soneto.
- Na
1ª parte, devem ser considerados dois
momentos distintos: a 1ª quadra, que
respeita ao retrato físico; a 2ª quadra e
o primeiro terceto, que evidenciam o retrato
psicológico.
- Aspectos
psicológicos:
- inconstante (propenso a
paixões)
- iroso
- anticlerical
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- o vocabulário alatinado
(níveas, letal, deidades)
- Elementos
românticos:
- o carácter autobiográfico
- o individualismo
- o tom confessional
- o amor sensual
-
Alguns
recursos estilísticos:
- adjectivação
(magro, azuis, moreno, meão, triste, alto,
pequeno, incapaz, propenso, níveas, escura,
infernais, letal, devoto, pachorrento); antítese
(vv 6, 7, 9/11); hipérbole (vv 9, 10);
anástrofe (v 8, 11, 12, 13).
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Apenas vi do dia a luz
brilhante
-
Estrutura interna bipartida:
- 1ª parte,
constituída pelas quadras e pelo 1º terceto,
na qual o sujeito poético nos dá conta do
infortúnio com que o Destino o marcou à
nascença, ao ponto de lhe ter roubado a mãe,
quando ainda era criança, e de o ter afastado
da Pátria e do resto da família (pai e
irmãos);
- 2ª parte,
constituída pelo último terceto, na qual o
sujeito poético, utilizando uma comparação
antitética que estabelece com a «insana
multidão», confessa apenas suspirar pela paz
da sepultura; Nota: talvez seja de
reparar o facto de o sujeito poético não se
ter coibido de utilizar o termo morte
(devorante), quando referido à mãe (vv 5/6), o
que evidencia o quanto, para si, foi dolorosa,
ao passo que, no final, porque é uma aspiração
sua, e já pacificada, utiliza um eufemismo.
- Aspectos
psicológicos:
- carácter sanguíneo
(marcado pelos Destinos (vv 3/4))
- carente de afectos (vv
5/8)
- desejoso da morte (v 14)
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- o vocabulário alatinado (
empório, devorante, vagando, insana)
- a presença da mitologia
(Túbal, Destinos, Marte)
- Elementos
românticos:
- o carácter autobiográfico
- o individualismo
- o tom confessional
- a crença no fatalismo de
que vítima
-
Alguns
recursos estilísticos:
- adjectivação
(brilhante, celebrado, sanguíneo, devorante,
terna, doce, distante, curva, profundo,
insana); metonímia (vv 2, 7); hipérbato
(vv 2/4, 11); apóstrofe (v 6); anáfora
(v 10); anástrofe (vv 1, 8); hipérbole
e perífrase (v 11); eufemismo
(v 14).
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Olha, Marília, as flautas
dos pastores
-
Descrição de um locus amoenus
ao longo de quase todo o soneto (até ao final do
1º terceto), muito ao gosto clássico. No
entanto, o sujeito poético esclarece que toda
aquela paisagem paradisíaca só é possível na
presença da amada (vv 13/14). Esta atitude de
apresentar a natureza como reflexo do estado da
alma do poeta, em função da presença ou ausência
da amada, é uma característica romântica.
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- o vocabulário alatinado (
cadente, Zéfiros, ósculos)
- a presença da mitologia
(Amores (Cupidos, filhos de Marte e de Vénus))
- Elementos
românticos:
- a natureza como reflexo
do estado da alma do poeta (em função da
presença ou ausência da amada)
- a pontuação subjectiva
(abundância de exclamações)
- a presença do rouxinol e
da noite
- o amor sensual
-
Alguns
recursos estilísticos:
- apóstrofe (vv 1,
3, 5); adjectivação (cadentes,
ardentes, alegre, clara); aliteração
(sobretudo de sons fricativos, sibilantes e
chiantes, e de vibrantes); personificação
(vv 3/4, 7/8, 9/11); anáfora (vv 1, 3,
10/11); anástrofe (vv 7/9...); hipérbole
(vv 13/14); metáfora (vv 4, 9, 11); sinestesia
(presença de várias sensações: auditivas,
visuais, tácteis, gustativas, olfactivas).
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Importuna Razão, não
me persigas
-
Estrutura interna tripartida:
- a 1ª parte,
constituída pelas duas quadras, apresenta uma
estrutura simétrica estabelecida pelos vv 1/2
e 7/8. Esta simetria denuncia uma intenção
reiterativa em relação à atitude de imprecação
do sujeito poético dirigida à «importuna
Razão». Entre os vv 2 e 7, assiste-se a uma
sequência de argumentos que justificam a
súplica do poeta;
- a 2ª parte, que
engloba o 1º terceto e parte do segundo (até
«...a desdenhe;»), contém o propósito e a
vontade da Razão;
- a 3ª parte, o
resto do soneto, mostra-nos como o desejo do
poeta se contrapõe ao da razão;
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- a presença da mitologia
(Amor)
- o apelo à Razão
- Elementos
românticos:
- a luta entre o amor e a
razão
- o tom confessional do
poema
- a vitimização do «eu»
- o sentimento do ciúme
-
Alguns
recursos estilísticos:
- apóstrofe (vv
1/...); adjectivação (importuna,
ríspida, frágil, injusta, vária, bela);
personificação (da Razão(voz da
consciência)); anáfora (vv 3/6); hipérbole
(vv 13/14); paradoxo (vv 5/6, 12/14);
reiteração (v 8 em relação ao v 1); metáfora
(v 11); gradação crescente (v 14).
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Sobre estas duras,
cavernosas fragas
-
Estrutura interna:
quatro
momentos
distintos:
- na 1ª quadra,
assiste-se à confissão do estado em que se
encontra o sujeito poético;
- na 2ª quadra,
verifica-se o anúncio do que tem sido o papel
da Razão (deve-se prestar atenção ao aspecto
verbal conferido pelo uso do gerúndio);
- no 1º terceto, o
sujeito poético confessa o que tem sido o seu
comportamento;
- no 2º terceto, a
confissão final de impotência do «eu», apesar
do socorro da Razão.
- Elementos neoclássicos:
- a forma (soneto)
- a presença da Razão
- Elementos românticos:
- a luta entre o amor e a
razão
- o tom confessional do
poema
- a vitimização do «eu»
(resultado da sua impotência na luta entre o
amor e a Razão)
- a presença de vocabulário
que nos remete para um locus horrendus
- Alguns recursos
estilísticos:
- metáfora (vv 3/4,
8/9, 13); comparação (vv 3/4); apóstrofe
(vv 5, 12); adjectivação (duras,
cavernosas, marinho, negras, crespas, feroz,
agudas, venenosas, cego, surdo); sinestesia
(vv 7, 9); personificação (da
Razão(voz da consciência)); hipérbole
(vv 10, 13/14); pergunta de retórica (v
12); paradoxo (vv 13/14); quiasmo
(v 11); gradação crescente (vv 11,
14).
- Notar um certo tom
teatral (interjeição exclamativa (v 7) e
pergunta de retórica (v 12)).
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A frouxidão no amor é
uma ofensa
-
Estrutura interna:
quatro
momentos
distintos:
- num primeiro momento (1ª
quadra), perante a brandura da
sua amada na relação amorosa, o sujeito
poético perspectiva a única forma como entende
o amor: vivido com fervor e nos seus extremos;
a explicação para esta sua postura encontra-se
no 1º verso: «A frouxidão no amor é uma
ofensa»;
- num segundo momento (2ª
quadra e v 9), o poeta,
apostrofando o tu, estabelece uma
comparação entre a forma como ele ama (vv 6/8)
e os sentimentos com que retribui o tu
(v 9);
- nos vv 10/11 (1º
terceto), o sujeito poético confessa
qual o tipo de comportamento que preferia ver
na amada, em vez da gratidão e da ternura;
- finalmente, no último
terceto, assistimos à explicação da
razão da sua preferência (a ausência da
plenitude no sentimento da amada fá-lo-á
sofrer mais que um possível «aspecto iroso»).
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- a alusão à razão, embora
a subalternização desta em relação ao
sentimento, como é o caso, seja uma atitude
romântica
- Elementos
românticos:
- a subalternização da
razão em relação aos sentimentos/atitudes
associados ao amor
- o tom confessional do
poema
- a vitimização do «eu»
(resultado da forma como ele próprio ama e da
forma como se sente (não) retribuído por parte
da amada)
-
Alguns
recursos estilísticos:
- anadiplose (vv
1/2); hipérbole (v 2); enumeração
(v 3); quiasmo (vv 3/4); apóstrofe
(vv 5); adjectivação (supremo, amoroso,
ingrata, dura, iroso, lânguida, cativo,
ditoso); sinestesia (vv 5/7); anáfora
(vv 5/7); gradação crescente (vv 6/7);
paralelismo (anafórico e mesmo em
relação à rima interna (vv 6/7)); metáfora
(v 8); anástrofe (vv 8, 12/13).
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Liberdade, onde
estás? Quem te demora
-
Estrutura interna:
três
momentos
distintos:
- num primeiro momento (vv
1/6), sentindo que é chegada a
hora da redenção, o sujeito poético,
apostrofando a Liberdade, numa sequência de
perguntas de retórica, questiona-a sobre onde
se encontra, quem a impede e porque
não raia já em Portugal;
- num segundo momento (vv
7/12), o poeta, numa linguagem quase
patética, implora à Liberdade o seu auxílio, o
seu socorro;
- finalmente, no 2º
terceto (vv 13/14), o sujeito
poético faz uma espécie de profissão de fé em
relação ao carácter divino da Liberdade,
proclamando-a «Mãe do génio e prazer».
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- algum vocabulário (Lísia,
grilhões, númen)
- o uso da perífrase
«esfera de Lísia» por Portugal
- Elementos
românticos:
- a aspiração pela
Liberdade
- uma certa linguagem
teatral (tom declamatório com presença de
algumas interjeições e de uma pontuação
subjectiva com abundância de exclamações e
perguntas de retórica, além das reticências)
-
Alguns
recursos estilísticos:
- personificação da
Liberdade (ao longo do poema) e do Despotismo
(vv 7/8); apóstrofe (v 1, 9); pergunta
de retórica (vv 1/4); anástrofe
(vv 2, 4, 5, 11, 13); adjectivação
(triste, santa, trémulo, feroz, frio, mudo,
pátrio); reiteração em relação ao porquê,
à causa (v 3); perífrase (v 4 (esfera
de Lísia por Portugal)); metáfora
(vv 3, 4, 6, 8, 10).
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soneto
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Liberdade
querida e suspirada
-
Todo o poema é uma longa apóstrofe,
iniciada no 1º verso («Liberdade querida e
suspirada») e terminada apenas no último («Mãe
dos prazeres, doce Liberdade»);
-
Personificando a Liberdade, o
sujeito poético vai tecendo a sua caracterização
(vv 1/4, 6/7, 9/14) até a definir como uma deusa
(vv 9, 13), mas também como «Mãe dos prazeres»
(v 14);
-
O sujeito poético dirige-se à
Liberdade quase em tom de súplica («Atende à
minha voz, que geme e brada / Por ver-te (...) /
(...) desterra a pena / Em que esta alma infeliz
jaz sepultada» (vv 5/8); «vem (...) vem (...)
vem (...) vem (...)» (vv 9/12)); esta
anaforização de «vem» tem um carácter
reiterativo que reforça a ideia da súplica;
-
A exaltação da Liberdade está
associada à condenação do Despotismo, em relação
ao qual é absolutamente incompatível;
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- algum vocabulário
(Despotismo (termo intimamente ligado ao
Iluminismo), descende (vocábulo alatinado (do
lat. descendere, descer))
- Elementos
românticos:
- a aspiração pela
Liberdade
- uma certa linguagem
teatral (tom declamatório com presença de
algumas interjeições e de exclamações)
- a vitimazação do eu
em relação à adversidade política e social
- o agudo sentido de
afirmação do mesmo eu
- Alguns
recursos estilísticos:
- personificação da
Liberdade (ao longo do poema) e do Despotismo (v
2); apóstrofe (vv 1, 3, 5, 7, 9/10,
12/14); comparação (vv 3/4, 11);
gradação crescente (v 5); hipálage
(v 5); metáfora (v 7/8, 12);
anástrofe (vv 11, 13); adjectivação
(querida, suspirada, acérrimo (superl. abs.
sint. de acre), serena, sereno, amena, gentil,
infeliz, imortal, doce); anáfora (vv 1,
3, 7, 9/10, 12); reiteração (vv
9/10).
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Oh retrato da Morte, oh
Noite amiga
-
Estrutura interna:
dois
momentos
distintos:
- as duas quadras,
em que o sujeito poético se dirige à «Noite
amiga», «retrato da Morte»; neste primeiro
momento, assistimos à caracterização da noite
(retrato da Morte, amiga, testemunha,
confidente) e ao pedido para que, uma vez
mais, ouça os seus desabafos, os seus
lamentos;
- os dois tercetos,
em que se dirige aos «mochos piadores»,
«cortesãos da escuridade» e «inimigos da
claridade»; neste segundo momento, o poeta
suplica aos mochos que, com a sua «medonha
sociedade», o ajudem a fartar o seu coração de
horrores;
- O
estado de alma do poeta é o resultado da falta de
afectos, a consequência da «cruel» que dorme (ao
contrário dele que passa uma noite de insónia) e
que o obriga a delirar (v 8);
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- a presença da mitologia
(Amor (Cupido, filho de Marte e de Vénus))
- o vocábulo escuridade
- Elementos
românticos:
- o tom confessional do
poema
- uma certa linguagem
teatral (tom declamatório com presença de
algumas interjeições e de exclamações)
- o uso de vocabulário
tétrico (Morte, escuridão, pranto, desgostos,
cruel, escuridade, Fantasmas, piadores,
medonha, horrores) que nos aproxima dum
ambiente próprio dum locus horrendus
-
Alguns
recursos estilísticos:
- personificação da
Noite e dos mochos (v 9); apóstrofe (v
1/4, 6/7, 9/12); elipse (v 3);
anástrofe (vv 4/5, 8, 12);
adjectivação (amiga, calada, antiga,
pio, vagos, piadores, inimigos, medonha);
reiteração (vv 7, 13/14 (através
da anáfora)); anáfora (vv 7,
13/14); sinestesia (vv 3, 5, 7,
9, 11/12); metáfora (vv 1, 4, 6, 9,
10, 13); comparação (v 11);
- notar a existência de
dois versos sáficos (com acento rítmico nas
4ª, 8ª e 10ª sílabas métricas): 8, 14.
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Já sobre o coche de ébano
estrelado
-
Estrutura interna:
duas
partes
distintas:
- as duas quadras,
um momento descritivo que nos pinta um quadro
de uma Natureza adormecida em profundo
silêncio, quando a noite já vai alta;
- os dois tercetos,
de características narrativas (narrador
autodiegético), em que o sujeito poético nos
dá conta da solidão em que se encontra
(solidão em sintonia com o «deserto bosque à
luz vedado» (v 4)), velando (num ambiente
próprio de velório fúnebre) à espera que
a Sorte (Destino) lhe corte o fio que o liga à
vida (o Destino confiava a três deusas, as Parcas,
suas filhas, a existência humana: Cloto
presidia ao nascimento e sustentava o fuso na
mão; Láquesis girava o fuso,
fiando os dias e os acontecimentos da vida; Átropos,
a mais velha das três, determinava o momento
final, cortando, com a sua fatal tesoura , o
fio da vida);
- Estas
duas
partes encontram-se ligadas por uma relação de
afinidade e de contraste: de afinidade, porque o
cenário descrito («locus horrendus»), com o
seu silêncio profundo, é o adequado ao estado de
espírito do sujeito poético (característica
romântica); de contraste, porque, enquanto toda a
Natureza dorme profundamente, o sujeito poético
mantém-se em vigília à espera do espectro da
Morte, que já vislumbra (v 13);
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- a presença da mitologia
(Noite (personificação das trevas, era,
segundo Hesíodo, a mais antiga das divindades;
filha do Caos, segundo uns, do Céu e da Terra,
segundo outros, a Noite residia habitualmente
nos infernos, correndo, no entanto, do
Ocidente para o Oriente ao encontro do Dia,
levando ao colo o Sono e a Morte; ao contrário
de Apolo, que era representado a conduzir um
carro brilhante e com rodas de fogo (sol), a
Noite conduzia uma carruagem escura, cobrindo,
com o seu manto, tudo por onde passava),
Zéfiro, Sorte)
- o recurso a perífrases
- Elementos
românticos:
- o tom confessional do
poema
- o tema do desejo da morte
- a construção de um
cenário de «locus horrendus»
- um certo sentimento de
masoquismo com preponderância para o terror e
a solidão
-
Alguns
recursos estilísticos:
- metáfora (vv 1,
5/6); personificação (vv
2, 5/6, 9); adjectivação (estrelado,
meio, escura, feia, profundo, deserto, vedado,
abafado, lisa, mavioso, costumado, presa, vil,
lânguida, total); perífrase (vv 1/2,
5); imagem (vv 1/2);
anástrofe (vv 1/2, 4/5);
hipérbato (vv 10/11); anáfora
(vv 7/9); reiteração (v 9
(através da anáfora)); eufemismo
(vv 9/11); sinestesia (vv 1/8,
13/14);
- notar a existência de
dois versos sáficos (com acento rítmico nas
4ª, 8ª e 10ª sílabas métricas): 7, 12;
- notar, ainda, a
importância da rima em ambos os tercetos
(Sorte/corte/Morte; presa/tristeza/Natureza).
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Meu ser evaporei na
lida insana
-
Este poema é o resultado de uma
atitude introspectiva do sujeito poético, o que
vai determinar a respectiva estrutura
interna. Assim, podemos considerar dois
momentos distintos:
- as duas quadras e
o 1º terceto, estrofes em que o
sujeito poético confessa ter gasto a sua vida
«na lida insana do tropel de paixões», porque
a sua «mente ufana» (orgulhosa) imaginava que
a essência humana era imortal, ou quase, e
porque, afinal, se deixou seduzir por inúmeros
sóis que lhe não indicaram o caminho da luz;
- o último terceto,
que corresponde ao momento do arrependimento:
num acto de contrição, o sujeito poético
dirige-se a Deus, desejando ser digno no
momento da sua morte, já que considera que o
não foi durante a vida;
- Notar
o
contraste entre o ritmo heróico (6ª e 10ª sílabas)
dos dois primeiros versos, marcando palavras como
evaporei, insana, paixões e
arrastava, relacionadas com
comportamentos de prazer e paixão, e o ritmo
sáfico (4ª, 8ª e 10ª sílabas) dos dois últimos,
marcando palavras ligadas ao arrependimento como momento,
perderam, anos, morrer, viver
e (não) soube;
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- a presença de vocabulário
alatinado (insana, mísero, falaz)
- o recurso a perífrases
- Elementos
românticos:
- o tom confessional do
poema
- o tema do arrependimento
- a alusão à morte
- o tom declamatório
- a pontuação expressiva
associada à função emotiva
-
Alguns
recursos estilísticos:
- metáfora (vv 1/3,
5/7, 9/12);
- personificação (v
9); adjectivação (insana, cego,
mísero, imortal, humana, inúmeros, ufana,
falaz, escrava, sedenta); perífrase (v
12); anástrofe (vv 1, 4,
5/6, 8, 10/11, 12); apóstrofe (vv 9,
12);
- notar a existência de
quatro versos sáficos (com acento rítmico nas
4ª, 8ª e 10ª sílabas métricas): 7, 8, 13, 14
(os dois últimos já referidos atrás).
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Já Bocage não sou!... À
cova escura
-
Também este poema é o resultado de
uma atitude introspectiva do sujeito poético, o
que determina, uma vez mais, a respectiva estrutura
interna:
- nas duas quadras,
o sujeito poético confessa uma vida de ultraje
a Deus no passado;
- nos dois tercetos,
assiste-se à confissão do arrependimento, o
que impele o sujeito poético a dirigir-se à
mocidade, que corria atrás da sua poesia, para
que rasgue seus versos e acredite na
eternidade;
- Notar
a
diferença que resulta da leitura do verso 6,
considerando o ritmo heróico (marca as palavras fez
e intento), ou o sáfico (marca as palavras
verso, louco e intento),
ambos possíveis;
- Elementos
neoclássicos:
- a forma (soneto)
- a presença da mitologia
(Musa)
- a presença de vocabulário
alatinado (estro, fantástico)
- a alusão à razão
- Elementos
românticos:
- o tom confessional do
poema
- o tema do arrependimento
- a alusão à morte
- o tom declamatório
- a pontuação expressiva
associada à função emotiva
-
Alguns
recursos estilísticos:
- adjectivação (escura,
desfeito, leve, dura, vã, louco, pura, fria,
alto, fantástico, ímpia) anástrofe
(vv 1/2, 6, 11/12); metonímia (v
3); antítese (v 4); apóstrofe
(v 7, 13); metáfora (v
11).
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