ACÇÃO - Processo de desenvolvimento
de acontecimentos singulares (determinados
pela evolução das atitudes ou dos
caracteres), podendo conduzir ou não a um
desenlace. Porque
a acção é um elemento dinâmico, só pode
ser entendida de modo evolutivo e situada
no tempo e no espaço.
ACÇÃO
PRINCIPAL -
Conjunto dos momentos fulcrais da história
que garantem a sua progressão numa ou
noutra direcção, de tal modo que a
supressão de um deles põe em causa a
coerência da própria história.
ACÇÃO
SECUNDÁRIA -
Evento que está relacionado com o
acontecimento principal que se desenrola
paralelamente à acção central e que mantém
em relação a ela uma posição de
subalternidade, cabendo ao narrador
estabelecer essa relação hierárquica.
ACTO - Divisão de uma peça teatral
que decorre no mesmo espaço
(cenário), constituindo a estrutura externa
da própria peça.
ALBA - Na lírica medieval provençal,
tematiza a amargura e melancolia que
decorrem da separação de dois amantes ao
amanhecer. As cantigas
que têm merecido esta designação não
registam todos estes elementos tópicos. Levad',
amigo que dormides as manhanas frias,
de Nuno Fernandes Torneol, revela-se um
exemplo da assimilação do género à
tradição poética da cantiga
de amigo.
topo
ALEGORIA - Metáfora
ou série de metáforas que concretizam um
pensamento ou uma realidade abstracta. A
alegoria aparece muitas vezes como uma personificação
(de virtudes, defeitos, etc.), mas pode
corresponder a um processo de construção
mais global (de um conto,
de um poema, etc.). O sentido alegórico
nasce da articulação dos termos
metafóricos patentes, que traduzem a
realidade abstracta a representar.
Ex.: Auto da Alma, Auto da Barca do
Inferno, de
Gil Vicente; o conto
"A Viagem", de Sophia de Mello
Breyner Andresen.
ALITERAÇÃO - Repetição
frequente dos mesmos sons consoantes em um
ou mais versos.
Ex.: "Deita o
lanço com cautela/Que a sereia canta
bela.../Mas cautela, ó pescador!" (Almeida
Garrett); "Foste colher (...) a um
granzoal azul de grão-de-bico/O ramalhete
rubro das papoulas" (Cesário Verde).
ALTERNÂNCIA - Técnica narrativa que consiste
em contar duas ou mais histórias de
maneira intercalada, de forma que ora se
narra uma ora outra.
ALVORADA - V. ALBA.
ANACOLUTO - Interrupção do membro inicial
de um período para formar outro, de acordo
com um novo pensamento que com o primeiro
se cruza, exigindo uma construção
sintáctica diferente.
topo
Ex.: "Eu, que
cair não pude neste engano/(Que é grande
dos amantes a cegueira),/Encheram-me, com
grandes abondanças,/O peito de desejos e
esperanças" (Luís de Camões).
ANACRONIA - Recurso narrativo que consiste
na alteração da ordem cronológica linear.
ANÁFORA - Repetição
da mesma palavra ou de palavras no início
de versos ou frases
sucessivos, visando-se, pela insistência,
a intensidade. Ex.: "Um mover de olhos,
brando e piadoso,/sem ver de quê; um riso
brando e honesto,/quase forçado; um doce e
humilde gesto (...)" (Luís de Camões).
ANAGNÓRISE - Elemento dramático de
surpresa, de regra na tragédia
clássica. Passagem do ignorar ao conhecer,
de uma situação em que se descobre uma
horrível discrepância entre a aproximação
afectiva naturalmente ditada por laços
consanguíneos de parentesco e a
hostilidade inelutável que a eles se
sobrepõe.
ANALEPSE - Processo narrativo (também
designado por flashback) que
consiste no relato de acontecimentos
anteriores ao presente da acção e mesmo em
alguns casos anteriores ao seu início.
ANANKÊ - O destino ou necessidade,
elemento fundamental da tragédia; é a força
inexorável que determina o rumo da acção e à qual
humanos, heróis e
deuses têm de se submeter.
topo
ANÁSTROFE - Inversão da ordem natural dos
elementos da frase. Não obscurece o
sentido do pensamento, como pode suceder
com o hipérbato.
Ex.: "No rigor da verdade, estás
pintada,/No rigor da aparência, estás com
vida" (Gregório de Matos).
ANIMISMO - Processo em que se atribui
vida a seres inanimados. Ex.: "Desce em
folhedos tenros a colina" (Camilo
Pessanha)
ANISOCRONIA - Conjunto de processos
narrativos (elipse,
sumário) mediante
os quais se manifesta a desproporção
temporal entre a narração
e os eventos narrados.
ANTAGONISTA - Personagem
individual ou colectiva que se opõe a
outra., geralmente o protagonista.
ANTÍTESE - Contraposição de palavras de
significação contrária, evidenciando o
contraste entre duas ideias.
Ex.: "Se
apartada do corpo a doce vida/Domina em
seu lugar a dura morte,/De que nace
tardar-me tanto a morte/Se ausente de alma
estou que me dá vida?" (Violante do Céu).
APARTE - Palavras ditas por uma personagem
(destinadas a serem ouvidas só pelos
espectadores), dando a entender ao público
que as outras personagens com quem
contracena não as ouvem no momento.
Através dos apartes o público torna-se
cúmplice dos actores.
topo
APÓSTROFE - Etimologicamente, mudança de
rumo. Interrompe-se o discurso para
invocar alguém, através do vocativo,
normalmente em forma exclamativa.
Ex.: "Ó
retrato da morte! Ó noite amiga!"
(Bocage).
ASSÍNDETO - Omissão dos elementos de
ligação (em geral conjunções copulativas)
entre palavras ou frases, produzindo um
efeito "martelante" que confere ao
discurso rapidez, força e energia.
Ex.: "Tendes
jardins, tendes canteiros,/Tendes pátrias,
tendes tectos" (José Régio); "Eu hoje
estou cruel, frenético, exigente" (Cesário
Verde).
ASSONÂNCIA - Coincidência das vogais só a
partir do último acento.
Ex.: "Ai
flores, ai flores do verde pino,/se
sabedes novas do meu amigo?/ai, Deus, e u
é?//Ai flores, ai flores do verde ramo,/se
sabedes novas do meu amado?/ai, Deus, e u
é?" (D. Dinis).
ASSUNTO - Concretização do tema no plano dos
textos.
ATAFINDA - Processo métrico da poesia
galego-portuguesa que consiste no encadeamento de
versos e de estrofes entre si
até ao fim da cantiga.
topo
AUTO - Texto
dramático, de tema
religioso ou profano, que se autonomizou
provavelmente a partir dos mistérios e
moralidades medievais e que conheceu
grande voga nas literaturas ibéricas.
AUTOCARACTERIZAÇÃO - Explicitação dos atributos da
personagem pela
própria personagem (auto-retrato).
AUTOR - Pessoa real responsável pela
concepção da obra literária.
BAILIA ou BAILADA - Designação
ambígua que se aplica quer às cantigas de esquema
paralelístico anafórico com leixa-pren e refrão e
se destinavam ao coro e à dança quer às cantigas de amigo
que, independentemente da forma estrófica,
tratam de temas
relacionados com a dança.
BARCAROLA - Poema medieval integrável no
género das cantigas
de amigo, e que se pensa exclusivo do
lirismo galego-português. A cena evocada
passa-se diante do rio ou do mar, sendo
habitualmente as ondas invocadas pela
menina, que lamenta a ausência do amigo.
CANÇÃO - Provavelmente relacionada com
a "cansó" provençal; no século XV passa a
designar uma composição de forma fixa, por
influência da "canzone" italiana,
cultivada por Dante e Petrarca. Praticada
também por Luís de Camões, é constituída
por uma série de estrofes,
de número regular de versos,
culminando numa estrofe
menor, em que a própria canção é
apostrofada.
CANCIONEIRO - Colectânea de poemas de vários
autores de uma dada
época literária. Os cancioneiros relativos
à nossa mais antiga poesia, a lírica
galego-portuguesa, composta entre cerca de
1196 e 1350, datam dos séculos XIII (Cancioneiro
da Ajuda) e XIV (Cancioneiro da
Biblioteca Nacional e Cancioneiro
da Biblioteca Vaticana). O Cancioneiro
Geral de Garcia de Resende foi
publicado em 1516 e reúne cerca de 300
composições dos reinados de D. Afonso V,
D. João II e D. Manuel.
topo
CANTIGA - Durante a época medieval,
designa uma curta forma poética em língua
vulgar. Na Arte de Trovar, tratado
de poética medieval, aplica-se a todos os
géneros. Termo utilizado pelos próprios
trovadores, atesta a união da poesia e da
música, na origem da nossa tradição lírica
ocidental. A partir do século XV,
dissociados poema e música, designa
qualquer peça lírica em versos
curtos (normalmente em redondilha menor e
maior); mais especificamente, designa uma
composição sujeita a mote, de quatro ou
cinco versos,
seguido de uma glosa
de oito ou dez versos, em que se
desenvolve o tema
enunciado no mote; nos casos em que temos
mais de uma glosa, estas são obrigadas ao
mesmo esquema estrófico, repetindo-se em
cada uma, a terminar, o último ou os dois
últimos versos do mote, textualmente ou
com variações.
CANTIGA DE AMIGO - Forma poética medieval
reconhecível pela utilização do termo
"amigo", ou de um vocabulário em torno de
termos como "madre", "filha", "amiga",
"irmana", "moça", "velida", etc., e pela
expressão, por um sujeito feminino, das
suas dores e alegrias amorosas.
CANTIGA DE AMOR - Forma poética medieval,
cultivada no ambiente cortesão, em que o
trovador exprime a sua paixão, não
correspondida, de forma convencional
(cortês e mesurada), por uma dama de
elevada estirpe social dotada de todas as
perfeições.
CANTIGAS DE ESCÁRNIO E MALDIZER - Formas poéticas medievais, em
que o trovador satiriza alguém ou uma
situação: de modo indirecto, irónica ou
sarcasticamente, no primeiro caso;
directamente, nomeando o visado, no
segundo caso. A diferença é estilística,
não temática, assentando no equívoco, pelo
qual o escárnio é definido.
topo
CANTIGA DE MESTRIA - termo da Arte de Trovar.
Forma poética que corresponde ao esquema
da "cansó" provençal, que se caracteriza
pela ausência de refrão.
CANTIGA DE REFRÃO - Forma poética caracterizada
pela repetição de um ou mais versos no final de
cada estrofe, que
corresponde à estrutura
típica da cantiga
peninsular medieval.
CANTIGA DE ROMARIA - Provavelmente de origem
galego-portuguesa; nas cantigas
de amigo, abrange aquelas em que se evocam
as circunstâncias específicas de uma
peregrinação ou romaria, em regra
associadas a uma situação amorosa.
CARACTERIZAÇÃO DIRECTA - Descrição
explícita dos atributos das personagens,
que pode ser feita por várias instâncias
narrativas: a própria personagem, outra
personagem ou o narrador.
CARACTERIZAÇÃO
INDIRECTA -
Ausência de descrição
explícita dos atributos das personagens,
sendo a sua caracterização deduzida a
partir dos seus comportamentos ou
linguagem.
CATACRESE - Metáfora
para que não há termo próprio disponível
na língua.
Ex.: A perna
da mesa; a folha de papel.
CATARSE - Processo psicológico de
purificação dos sentimentos do espectador
da tragédia, que
se identifica com os conflitos
representados.
topo
CATÁSTROFE - Definida na Poética de
Aristóteles como uma acção
perniciosa e dolorosa que provoca uma
reacção emocional marcada pelo excesso (pathos).
CENA - Divisão de um acto,
marcada pela entrada ou saída de uma personagem.
CIRCUNLÓQUIO - Substituição de uma palavra
por uma expressão mais longa, cujos termos
designam analiticamente a realidade por
ela referida. Pode atenuar ou velar a
realidade a designar (eufemismo,
enigma) ou descrevê-la explicitamente
(definição, descrição).
Ex.: "(...)
mísera e mesquinha,/que depois de morta
foi rainha" (Luís de Camões); "No tempo em
que não tínhamos idade" (Manuel Alegre).
CLÍMAX - Etimologicamente, escada, gradação. O ponto
máximo de intensidade numa sequência de
ideias ou acontecimentos. No texto dramático
corresponde ao ponto máximo da tensão a
partir do qual se define o desfecho.
COMÉDIA - De origem obscura, supõe-se
que se relaciona com cantos em festins de
homenagem a Dioniso, que terão evoluído
para manifestações jocosas e histriónicas.
Peça teatral que visa a crítica social
através da representação de situações que
evoquem a vida real e o insólito pelo qual
muitas vezes se revela. O recurso ao
ridículo, que provoca o riso, tem
geralmente uma intenção moralizadora.
topo
COMENTÁRIO - Intervenção do narrador no
discurso do texto
narrativo, em articulação com a narração de eventos
ou com uma descrição,
mas com marcas formais e semânticas
próprias. Os comentários do narrador podem
fazer parte de uma digressão,
mas não se identifica necessariamente com
esta.
COMPARAÇÃO - Confrontação de duas
realidades para discernir entre elas
semelhanças ou diferenças. O
estabelecimento de analogias está na base
de figuras como a imagem
e a metáfora; a antítese nasce da
dilucidação das diferenças.
Ex.: "Como
morcegos, ao cair das badaladas,/Saltam de
viga em viga os mestres carpinteiros"
(Cesário Verde); "O sonho é uma constante
da vida/Tão concreta e definida/Como outra
coisa qualquer/Como esta pedra cinzenta
(...)/Como estas aves que gritam/Em
bebedeiras de azul" (António Gedeão);
"(...) toco a solidão como uma pedra"
(Sophia de Mello Breyner Andresen); "São
como um cristal,/as palavras,/Algumas, um
punhal,/um incêndio./Outras,/Orvalho
apenas" (Eugénio de Andrade); "Aquela
nuvem/parece um cavalo.../Ah! Se eu
pudesse montá-lo" (José Gomes Ferreira);
"E a lua lembra o circo e os jogos
malabares" (Cesário Verde).
CONOTAÇÃO - Característica fundamental do
texto literário, expressa na linguagem
figurada, pela qual se desenvolve um
conjunto de sentidos que fogem a uma única
significação de cada termo.
CONTEXTO - Termo linguístico que designa
tanto as palavras que pertencem a um
determinado enunciado como a realidade a
que as palavras se referem (contexto
extra-verbal). Na análise de um texto
literário, o contexto diz respeito à
realidade sócio-histórico-cultural em que
a acção se insere
(cf. TEMPO
HISTÓRICO).
topo
CONTO - Género
narrativo em prosa caracterizado por uma
extensão reduzida, poucas personagens e
concentração espácio-temporal. A acção é linear,
circunscrevendo-se a um conflito, a um
episódio ou a um acontecimento insólito,
por vezes aparentemente insignificante.
CONTO
POPULAR - Conto de autor anónimo que faz
parte da literatura tradicional de
transmissão oral, circulando de geração em
geração.
DENOTAÇÃO - O significado primeiro e
objectivo de um vocábulo, directamente
derivado da relação entre as palavras e as
coisas, ou seja, entre o signo linguístico
e o seu referente.
DESCRIÇÃO - Fragmento discursivo portador
de informação sobre as personagens, os
objectos, os lugares, o tempo, facilmente
destacável do conjunto textual.
Essencialmente estático, constitui momento
de pausa na progressão linear dos eventos
e, quando suprimido, não compromete a
coerência interna da história. A acção sofre um corte
na sua dinâmica para se fixar num
imobilismo não sujeito a uma ordenação
cronológica.
A descrição
implica frequentemente alterações ao nível
do discurso:
- a passagem
do presente ao imperfeito;
- o emprego
frequente de verbos de estado;
- por vezes,
a estruturação do espaço
em torno de uma personagem
ou vice-versa;
A descrição
contribui para a delimitação de subgéneros da
narrativa: no romance
histórico e nas narrativas de descrição,
assume particular relevo a descrição do espaço; no romance
psicológico, a descrição da personagem.
topo
DESENLACE - Definido por Aristóteles como
o momento da tragédia
em que o curso dos eventos se altera
determinando o final feliz ou infeliz da acção.
DIACRONIA - Sucessão de tempo. Esta noção
aplica-se, por exemplo, ao estudo da
evolução dos fenómenos literários.
DIÁLOGO - Forma de discurso e modo de
expressão literário em que o "emissor" e o
"receptor" se alternam na comunicação das
respectivas mensagens. Surge nos textos
narrativos, nos dramáticos e, por vezes,
nos líricos. Encontra-se estreitamente
relacionado com o discurso da personagem e com
o conceito de cena. A
reprodução fiel do diálogo entre as
personagens (estratégia de representação
próxima da representação dramática)
implica a utilização do discurso directo -
tentativa de aproximação máxima, no plano
do discurso, da duração dos acontecimentos
narrados - e o apagamento do narrador que dá a
palavra às personagens, embora lhe caiba
ainda o papel de organizador da narrativa;
é o narrador quem decide da sua
instauração ou interrupção em função de
economia da narrativa. O discurso directo
apresenta registos de língua
diversificados (traços idiolectais,
sociolectais e dialectais) que contribuem
para a caracterização
da personagem que o profere.
DIDASCÁLIA - Texto secundário constituído
pelas informações fornecidas pelo
dramaturgo (autor)
sobre, por exemplo, o tempo e o lugar da acção (cenário), o
vestuário, os gestos das personagens, etc.
Cabe ao encenador e aos actores, ao
definirem a representação, a actualização
das indicações cénicas.
topo
DIEGESE - Termo utilizado por Genette
para designar a história e o universo
espácio-temporal em que ela se desenrola.
DIGRESSÃO - Desvio em relação ao assunto
que está a ser desenvolvido: a narrativa é
interrompida e o narrador
formula comentários,
observações ou opiniões que se afastam
temporariamente dos eventos relatados.
DISCURSO
INDIRECTO LIVRE
- Expressão que designa o discurso
semidirecto em que o emissor, para dar
maior vivacidade à sua comunicação,
suprime geralmente o verbo e o conector
próprios do discurso indirecto, misturando
assim a voz do narrador
com a da personagem
em causa, como se ambos falassem em
uníssono. É uma espécie de voz dual
em que se preserva, até certo ponto, a
expressividade do discurso directo
(observe-se, por exemplo, que nele se
conservam sem modificação os deícticos
espaciais e temporais do discurso
directo).
Ex.: "O poeta
sorria, passando os dedos com complacência
pelos longos bigodes românticos que a
idade embranquecera e o cigarro amarelara.
Que diabo, algumas compensações havia de
ter a velhice! Em todo o caso o estômago
não era mau, e conservava-se, caramba,
filhos, um bocado de coração" (Eça de
Queirós).
DISFEMISMO - Modo de expressar uma
realidade desagradável de uma forma ainda
mais rude e agressiva.
topo
Ex.: "(...)
enquanto os vermes iam roendo esses
cadáveres amarrados pelos grilhões da
morte" (Alexandre Herculano).
DISSERTAÇÃO - Discurso de carácter
argumentativo em que o seu autor examina,
desenvolve e defende um ponto de vista ou
tese sobre determinada matéria (cf. TEXTO
ARGUMENTATIVO).
DOBRE - Processo versificatório
definido na Arte de Trovar.
Repetição vocabular simétrica numa estrofe e
reproduzida em todas as estrofes segundo a
mesma disposição nos versos.
DRAMA - 1. Embora o drama pressuponha
os elementos que constituem uma intriga
(personagens e acções, coordenadas de
tempo e espaço),
define-se especificamente pela
representação, através de palavras e
acções, num espaço destinado a esta
finalidade. Etimologicamente, significa "acção",
desenrolando-se esta a partir de um
conflito ou crise, resolvidos num tempo
determinado, condicionado pelo tempo da
representação. Acção,
espaço e tempo serão concentrados em
função da necessidade da representação. Os
códigos simbólicos de imitação do real são
de vária ordem, no drama. Nele podem
operar, para além das linguagens verbal e
gestual, os recursos na luminotecnia e da
sonoplastia, os cenários, o guarda-roupa,
a maquilhagem, as máscaras, toda a espécie
de adereços cénicos, etc. Pela sua
natureza de representação in presentia
de um acontecimento, mediante uma acção que se desenrola
perante os espectadores, sempre foi
manifesta a vocação pedagógica e
doutrinária do drama, atestada, por
exemplo, pela função ético-moral da tragédia grega,
celebração de implicações sociais e
religiosas, pela função moralizadora e
escatológica dos mistérios medievais ou
pela sua exploração como veículo de
propaganda ideológica.
2. Designação
ambígua para qualquer peça teatral onde se
gera um conflito psicológico. A partir do
Romantismo, o drama passou a designar um
género dramático híbrido entre a tragédia
e a comédia.
topo
ÉCLOGA - Associada à poesia bucólica,
passou a designar toda a composição de tema pastoril e
campestre. Pela sua estrutura
dialógica, adequa-se ao debate ideológico,
permitindo o ensaio de novos metros e temas.
ELIPSE - Supressão de elementos do
discurso, frásicos, vocabulares ou
silábicos, de que resultam a rapidez,
sobriedade e espontaneidade do enunciado,
logo, a sua intensidade. No texto narrativo
consiste na supressão de lapsos temporais
mais ou menos longos.
Ex.:
"Querei-los conhecer bem?/No fruito os
conhecereis./Obras, que palavras não!" (Sá
de Miranda).
ENCADEAMENTO - Técnica narrativa segundo a
qual o tempo da acção
se desenrola de forma linear, de tal modo
que o fim de uma sequência
é o início da seguinte.
ENCAIXE - Técnica narrativa segundo a
qual uma acção
secundária se introduz na acção principal.
ENUMERAÇÃO - Apresentação de elementos em
série. Se são do mesmo género, a
enumeração é simples; se entre eles não há
relação aparente, é caótica; se é apenas o
último elemento da enumeração a revelar o
aspecto comum que os aproxima, é
recolectiva.
Ex.:
"Ocorrem-me em revista exposições,
países:/Madrid, Paris, Berlim, S.
Petersburgo, o mundo!" (Cesário Verde); "O
céu, a terra, o vento sossegado.../As
ondas, que se estendem pela areia/Os
peixes, que no mar o sono enfreia.../O
nocturno silêncio repousado..." (Luís de
Camões).
topo
EPOPEIA - Poema narrativo longo que
representa e celebra um feito heróico de
interesse nacional e universal, num estilo
elevado e sublime.
ESCANSÃO - Decomposição do verso nas suas
unidades métricas,
que frequentemente coincidem com as
sílabas.
ESPAÇO - Os componentes físicos que
servem de cenário ao desenrolar da acção e à movimentação
das personagens; em segunda instância, o
conceito de espaço pode ser entendido em
sentido mais lato, compreendendo quer
atmosferas sociais (espaço social) quer
psicológicas (espaço psicológico).
ESPARSA - Composição originária da
Provença, de uma estrofe
só, que pode oscilar entre os oito e os
dezasseis versos.
ESTROFE - Sucessão de vários versos, constituindo
uma secção de um poema. As estrofes de um
poema apresentam muitas vezes o mesmo
esquema rimático e métrico. Se o poema for
composto por uma só estrofe, não se pode
falar em organização estrófica. A estrofe
é isométrica se
todos os versos que a compõem têm o mesmo
metro, heterométrica se isso não acontece.
Se a mesma estrofe se repete ao longo do
poema, ela constitui-se como refrão. Se a
estrofe é composta por dois versos,
chama-se dístico; se for de três versos,
temos um terceto, se for de quatro, temos
uma quadra, de cinco, a quintilha, de
seis, a sextilha, de sete, a setilha, de
oito, a oitava, de nove, a novena, de dez,
a décima, etc.
topo
ESTRUTURA EXTERNA - Refere-se, segundo algumas
propostas, à "forma" do texto literário, à
disposição gráfica e aos níveis fonético,
morfológico e sintáctico. Designa também a
divisão formal de um texto.
EUFEMISMO - Modo de expressar com decoro
conceitos ou ideias cuja expressão franca,
não atenuada, seria dura ou desagradável.
Os processos que mais frequentemente
servem esta suavização do pensamento
assentam no recurso a perífrases,
sinónimos e metáforas,
que obviam à expressão directa e clara do
termo ou ideia a evitar.
Ex.: "/O
Conselheiro Acácio/ nunca usava palavras
triviais; não dizia vomitar (...)
empregava restituir" (Eça de Queirós);
"Tirar Inês ao mundo determina" (Luís de
Camões).
FÁBULA - Em sentido lato, a história
ficcional que se narra ou representa. Em
sentido restrito, uma narrativa, em verso ou em prosa, em
que as personagens são em geral animais e
cuja história encerra, de modo explícito
ou implícito, um ensinamento moral.
FARSA - Autonomizando-se a partir de
quadros cómicos que pontuavam os mistérios
medievais, a farsa distingue-se da comédia pelo recurso
a processos menos subtis de construção do
cómico, explorando incongruências,
equívocos, traços caricaturais e situações
ridículas. Expedientes farsescos,
redundando numa perspectiva satírica,
marcam várias comédias
desde a Antiguidade até à comédia romântica.
FATUM - V. ANANKÊ.
topo
FINDA - Na lírica galego-portuguesa, a
última estrofe de
uma cantiga, de estrutura própria,
mas ligada pela rima
às demais, com uma função conclusiva.
FOCALIZAÇÃO - Ciência do narrador ou de uma
personagem
quanto ao conhecimento que detém da acção.
FOCALIZAÇÃO
EXTERNA - O narrador sabe
apenas o que vê; o seu conhecimento incide
sobre as características observáveis de
uma personagem,
de um espaço ou de
uma cena.
FOCALIZAÇÃO
INTERNA -
Instauração do ponto de vista de uma personagem que
resulta na restrição dos elementos
informativos transmitidos. O narrador apaga-se e
o que prevalece é a visão que a personagem
detém sobre as outras personagens, espaços ou
acontecimentos, sendo assim limitada pela
capacidade de conhecimento da própria
personagem.
FOCALIZAÇÃO
OMNISCIENTE -
O narrador
conhece todo o objecto da narração e detém o
máximo de informação sobre as personagens,
penetrando no seu íntimo, e sobre o
evoluir dos acontecimentos.
GÉNERO LITERÁRIO - Categorias historicamente
situadas, apreendidas através de um
conjunto de unidades discursivas,
empiricamente observáveis, a partir das
quais se define a classe dos textos
(Todorov).
GERAÇÃO - Determinado período de tempo
em que um grupo de escritores, comungando
de preocupações sociais convergentes, de
anseios históricos e de orientações
estético-literárias também semelhantes,
produziu a maior parte das suas obras.
topo
GLOSA - Estrofe
em que o poeta desenvolve um mote, próprio
ou alheio, recuperando, textualmente ou
com variações, um ou mais versos do mote.
GRADAÇÃO - Enumeração
de elementos numa sequência determinada
por uma ordem ascendente ou descendente,
crescente ou decrescente.
Ex.: "(...)
duro, seco, estéril monte (...)" (Luís de
Camões).
HERÓI - Personagem
principal numa obra narrativa ou dramática
que encarna de modo exemplar os valores
positivos e mais respeitados de uma
determinada comunidade ou de determinada
época.
HETEROCARACTERIZAÇÃO - Explicitação dos atributos da
personagem por
outra personagem ou pelo narrador (cf. CARACTERIZAÇÃO
DIRECTA).
HETERÓNIMO - Nome usado por um autor para assinar
textos seus, como se fosse outra pessoa
com biografia própria, mundividência e
estilo peculiares.
HIPÁLAGE - Atribuição a um ser ou coisa
designada de uma qualidade ou acção que
pertence a outro ser ou coisa implicada na
mesma frase.
Ex.: "Fumava
o pensativo cigarro" (Eça de Queirós);
"amareladamente os cães parecem lobos"
(Cesário Verde).
topo
HIPÉRBATO - Inversão violenta da ordem das
palavras na frase, separando termos que
deveriam estar ligados sintacticamente,
para destacar um vocábulo ou expressão,
para sugerir a beleza duma formulação.
Ex.: O sol é
grande, caem co'a calma as aves/do tempo
em tal sazão, que soe ser fria" (Sá de
Miranda); "Casos que Adamastor contou
futuros" (Luís de Camões).
HIPÉRBOLE - Exagero de termos que visa
enfatizar a expressão, apresentando
imagens e situações que ultrapassam o que
se crê ser a realidade.
Ex.: "Chove
nela graça tanta, que dá graça à
fermosura" (Luís de Camões).
HYBRIS - Sentimento de orgulho
desmedido que leva os heróis
da tragédia a
perpetrar uma violação à ordem
estabelecida, através de uma acção que se
constitui como um desafio aos poderes e
ordem divinos. Incorrem num erro, hamartia,
que provoca a némesis, indignação
divina que se consubstancia numa punição
ou desgraça que sobre eles se abate.
IMAGEM - Termo de definição
problemática, semanticamente fluido.
Concebida como um tipo de
representação/consciência de uma realidade
sensível, no campo literário relaciona-se
e confunde-se com a comparação,
a metáfora e o
símbolo, como processos figurativos da
linguagem. Expressão de uma percepção
intensificada e unificadora, apresenta-nos
como consumada a identidade de duas
realidades distintas, que aproxima.
Segundo Octavio Paz, reconcilia o homem
com o fluir cósmico, visto que, iludindo o
princípio da não contradição, lhe permite
reunir e assumir identidades opostas,
indiferentes ou estranhas entre si,
instituindo a identidade dos contrários.
Pound definiu-a como um complexo
intelectual e emocional num determinado
instante de tempo, provocando-nos a
sensação de instantânea libertação dos
limites de tempo e espaço.
Nesse sentido, pode, numa outra acepção,
considerar-se a imagem também como a
percepção resultante de comparações e
metáforas.
Ex.: "A minha
casa é concha"; "Tu me deste a palavra,
noz de fogo" (Vitorino Nemésio); "Tombo
das imagens/Como um pássaro morto das
folhagens/tombando se desfaz na terra
fria" (Sophia de Mello Breyner Andresen);
"As ondas lutam, como feras mugem" (Camilo
Pessanha); "Lágrimas são a chuva que nos
molha/A vida inteira"; "Mas que vento
levanta e, quando sopra/A geografia vária
e a dor mais funda,/Atira o teu olhar por
sobre a alma? E vê como ressurge e
ainda/Treme aquela imagem que soluça/E
lentamente se afasta na
distância/Inconquistável, carregada de
âncoras" (Ruy Cinatti).
topo
INTERROGAÇÃO
RETÓRICA -
Pergunta que se formula para se reforçar o
que se está a dizer e não para obter uma
resposta.
E.: "Quem
poluiu, quem rasgou os meus lençóis de
linho,/Onde esperei morrer - meus castos
lençóis?" (Camilo Pessanha).
IRONIA - Processo retórico pelo qual se
significa o contrário do que se diz
literalmente, o que por vezes apenas o contexto permite
entender.
Ex.: "Tu é que sabias, Galileo
Galilei./Por isso eram teus olhos
misericordiosos/(...) Por isso
estoicamente, mansamente/resiste a todas
as tonturas/(...) enquanto eles, do alto
inacessível das suas alturas,/foram
caindo,/caindo,/caindo,/caindo,/caindo
sempre,/e sempre,/ininterruptamente,/na
razão directa dos quadrados dos tempos"
(António Gedeão)
ISOCRONIA - Técnica narrativa que consiste
em apresentar o discurso narrativo com uma
duração idêntica à do tempo real da
história narrada.
LEIXA-PREN - Técnica poética de encadeamento de
estrofes; em cada
estrofe repetem-se, ou os versos da estrofe
anterior com ligeira variação das palavras
finais (estrofes pares), ou um dos versos
da estrofe que precede a anterior
(estrofes ímpares).
topo
LINGUAGEM
LITERÁRIA - De
um modo geral, qualquer manifestação
literária distingue-se pela utilização de
uma linguagem construída fundamentalmente
com uma preocupação estética. A produção
desse tipo de linguagem pretende captar a
adesão do destinatário para a sua própria
mensagem criando uma realidade própria,
independentemente da realidade exterior da
obra.
MARINHA - V. BARCAROLA.
MEDIDA VELHA E MEDIDA NOVA - Duas técnicas versificatórias,
no séc. XVI: a primeira designa a
tradicional (estruturas
e metros utilizados pelos poetas do Cancioneiro
Geral, como o vilancete,
a cantiga, a esparsa, em
redondilha menor ou maior); a segunda, a
importada de Itália por Sá de Miranda e
António Ferreira (com um novo verso, o decassílabo,
e novas formas e subgéneros, como o soneto, a canção, a sextina, a
elegia, a écloga, a
ode, a terza rima,
etc.).
METÁFORA - Etimologicamente,
"transporte", "mudança", "trânsito":
transpõe-se um termo para um campo de
significado que lhe é alheio. É definida
como "comparação
abreviada", na qual o termo comparado
(substituído, não nomeado) se identifica
com o termo que lhe é semelhante. Diz-se A
(não nomeado) por meio de B, supondo-se
que entre ambos existe uma relação de
similitude.
Ex.: "Meu
povo traído, mansa colmeia" (Miguel
Torga); "Dormem na praia os barcos
pescadores (...)//E a curva do seu
bico/Rói a solidão" (Sophia de Mello
Breyner Andresen); "A tarde sacudiu as
suas crinas" (Eugénio de Andrade).
topo
METONÍMIA - Designa-se uma realidade por
meio de um termo referente a outra com a
qual está relacionada de uma forma
objectiva - por contiguidade (relação com
aquilo que a rodeia). Há diversos tipos de
metonímia (diz-se o conteúdo pelo
continente, ou vice-versa; a causa pelo
efeito, ou vice-versa; o possuidor pela
coisa possuída, o autor
pela obra, etc.).
Ex.:
"Senhora, partem tão tristes/Meus olhos
por vós, meu bem,/Que nunca tão tristes
vistes,/outros nenhuns, por ninguém" (João
Roiz de Castel-Branco).
MÉTRICA - Consideração de todos os
elementos que constituem o ritmo do discurso
poético (no sentido tradicional do termo,
a prosódia é o
estudo de todas as regras relativas à
métrica, isto é, à versificação).
MODOS
LITERÁRIOS -
Categorias meta-históricas e universais
(narrativa, lírica e drama)
cujas constantes são historicamente
actualizadas nos géneros.
MONÓLOGO - Variante do diálogo: é um
diálogo interiorizado, em que o "eu" se
desdobra em emissor (o "eu" que fala) e
receptor (o "eu"/"tu" que escuta). Por
meio do monólogo, a narrativa abre-se à
expressão do tempo de vivência das
personagens, sendo fundamental no romance psicológico
moderno. Exprime um discurso mental, cuja
enunciação acompanha as ideias e as
imagens que se desenrolam no fluxo da
consciência das personagens. Formalmente,
caracteriza-se pela fluidez sintáctica,
pontuação escassa, liberdade de
associações lexicais, frases em suspenso,
emprego de verbos no infinitivo e frases
reduzidas à sintaxe mínima.
topo
MONÓLOGO
INTERIOR -
Formulação verbal do pensamento de uma personagem que
nos introduz directamente na sua vida
interior.
MOZDOBRE - Definição a partir de dobre; a diferença é
que a palavra repetida surge sob formas
diversas.
NARRAÇÃO - Processo de enunciação que
consiste no "acto narrativo produtor", no
discurso do narrador.
A narração caracteriza-se pelo dinamismo,
dado o relevo aí assumido pela acção (por oposição ao
estatismo da descrição),
ou
seja, pela sucessão encadeada de
acontecimentos susceptíveis de serem
temporalmente referenciados. As acções
evocadas apresentam o cunho da
instantaneidade, traduzida pelo emprego do
pretérito perfeito ou formas afins, como o
chamado presente histórico ou o
mais-que-perfeito, deícticos e verbos de
acção. É preciso distinguir a narração da
história e a história narrada (a
"história" ou conteúdo narrativo), o que
implica a distinção entre o tempo do
discurso e o tempo da história (cf. TEMPO DO
DISCURSO e TEMPO DA
HISTÓRIA).
Narração é
também entendida como um procedimento
oposto à descrição
ou ainda como modelo literário que se
distingue do modo dramático e do lírico.
NARRADOR - Ser virtual criado pelo autor a quem cabe a
tarefa de enunciar o discurso narrativo,
organizar o modo de narrar e decidir do
ponto de vista a adoptar; é ao narrador
que cabe a configuração do universo
diegético. Quanto à presença, o narrador
classifica-se como:
Autodiegético
- narrador
coincidente com o protagonista ou o herói;
Heterodiegético
- o narrador
não participa como personagem
na história narrada;
Homodiegético
- o narrador
participa na história narrada, mas não
como protagonista.
topo
NARRATÁRIO - Termo introduzido na
narratologia para designar a instância
ficcional, inscrita no texto, à qual é
endereçado o discurso produzido pelo narrador.
NARRATIVA ABERTA - O leitor não fica a conhecer o
destino definitivo das personagens ou o
epílogo do romance.
NARRATIVA FECHADA - O leitor fica a conhecer a
sorte final de todas as personagens e as
derradeiras consequências da diegese romanesca.
Isto é, a diegese é claramente delimitada
com um princípio, meio e fim.
NOVELA - Relato normalmente de curta
dimensão, com um número variável de
personagens e uma intriga algo complexa.
ODE - De início, consistia num poema
destinado ao canto, evoluindo
posteriormente para a exaltação de heróis, glosando temas épicos, oratórios
e dramáticos. É constituída por três
partes, estrofe,
antístrofe e epodo, iniciando-se e
terminando por elogios que enquadram a narração de
episódios míticos. Foi introduzida em
Portugal no século XVI.
ONOMATOPEIA - Palavras que pretendem imitar
sons.
Ex.: "Aquele
comboio malandro/passa/passa sempre/com a
força dele/ué ué ué/hii hii
hii/te-quem-tem te-quem-tem te-quem-tem"
(António Jacinto).
topo
ORDEM REAL
OU TEMPORAL DOS ACONTECIMENTOS - A ordem de sucessão dos
eventos ou segmentos temporais na
história.
ORDENAÇÃO DA NARRATIVA - caracteriza-se por uma
situação inicial, um desenvolvimento ou conflito e por uma conclusão
ou desenlace:
Situação
inicial -
primeira parte de uma intriga (narrativa
ou dramática) na qual se expõem as linhas
gerais do tema ou
argumento;
Desenvolvimento
- elemento essencial da acção narrativa ou
dramática. O conflito que divide as
personagens pode ser físico ou cósmico
(Homem/Natureza); psicológico
(Razão/Paixão); económico-social
(Riqueza/Pobreza); político
(Poder/Resistência); moral (Bem/Mal);
religioso (Fé/Razão);
Conclusão
- a parte final de uma
narrativa na qual se solucionam os
conflitos. Em certas narrativas modernas
não existe conclusão, deixando-se ao
leitor a possibilidade de colaborar com o
narrador na
continuação da história narrada (cf. NARRATIVA
ABERTA).
OXIMORO - Aproximação de termos que
mutuamente se excluem, numa intensificação
do processo da antítese.
Exprime um paradoxo e implica uma nova
visão das coisas.
Ex.: "O mito
é o nada que é tudo" (Fernando Pessoa); "O
semelhante sem semelhante" (P. António
Vieira).
topo
PALAVRA PERDUDA - Artifício usado pelos
trovadores, considerado na Arte de
Trovar como prova de mestria, que
consiste em inserir, no corpo de uma estrofe, um verso que não rima com
nenhum dos versos da mesma estrofe.
PARALELISMO - Princípio estrutural
fundamental da lírica galego-portuguesa,
que resulta em diversos processos
estilísticos: repetição
de palavras, de estruturas
sintácticas e rítmicas e de conceitos. Na
paralelística de esquema típico, em
dísticos, o segundo verso
do primeiro dístico é o primeiro verso do
terceiro; o segundo do segundo dístico
será o primeiro do quarto, etc. Para
obviar à monotonia que pode resultar deste
princípio rítmico, os trovadores trabalham
a variação, dentro dos esquemas
paralelísticos, a vários níveis
(substituição da palavra rimante por um
sinónimo, por exemplo). Processo que
documenta a ligação indissociável entre a
poesia e a música.
PASTORELA - Poema medieval do qual restam
exemplares em provençal e em langue
d'oil e cuja representação na lírica
galego-portuguesa é discutível. A sugestão
de um encontro amoroso entre um cavaleiro
e uma pastora num ambiente campestre, que
se pode concretizar, ou não, num diálogo entre ambos,
é no entanto suficientemente marcada para
que se reconheça em algumas composições da
lírica galego-portuguesa a intenção de
compor uma pastorela, embora integre
elementos específicos da tradição poética
ibérica.
PERÍFRASE - V. CIRCUNLÓQUIO.
PERIPÉCIA - Definida na Poética de
Aristóteles como "a mutação dos sucessos
no seu contrário", consiste, pois, num
elemento de surpresa que se produz quando
um facto altera o desenvolvimento previsível da acção
dramática, desenrolando-se esta ao
contrário do que o decurso dos eventos
representados faria esperar.
topo
PERSONAGEM - Ser ficcional que habita o
mundo do texto
narrativo ou do texto dramático
e que com os seus sentimentos, a sua
maneira de ser, a sua ideologia, as suas
palavras e os seus actos enforma a
história narrada. A personagem tem em
geral um nome - e é identificada muitas
vezes por um retrato
físico e por um retrato
psicológico-moral. É sobretudo
mediante a personagem, as suas falas,
directa ou indirectamente reproduzidas
pelo narrador, os
seus comportamentos e os seus actos que se
manifestam no texto narrativo e no texto
dramático valores éticos e posições
ideológicas. Uma personagem pode ser estática,
se não se transforma ao longo da acção, e dinâmica,
no caso contrário. A personagem pode ser plana,
se é construída com base num número
reduzido de atributos, sem profundidade
nem complexidade; pode ser redonda,
no caso contrário.
A personagem
plana representa com frequência um tipo humano, no plano
psicológico-moral e sociológico (o
avarento, o cobarde, etc.). A personagem
pode ainda definir-se em termos de relevo
que determina a sua importância na
economia da intriga. Assim, temos: personagem
principal - o herói
ou protagonista - e as personagens
secundárias e figurantes.
Como entidade
ficcional, pode sê-lo inteiramente ou
transmigrar do mundo histórico para o
universo da ficção.
PERSONAGEM
DINÂMICA - V.
PERSONAGEM.
PERSONAGEM
ESTÁTICA - V.
PERSONAGEM.
PERSONAGEM
PLANA - V.
PERSONAGEM.
PERSONAGEM
REDONDA OU MODELADA - V. PERSONAGEM.
PERSONIFICAÇÃO - V. PROSOPOPEIA.
topo
PLEONASMO - Redundância.
Reforça a ideia contida numa palavra
juntando-lhe uma palavra ou grupo de
palavras cujo sentido está implicado na
primeira. É normalmente apontado como
erro, mas serve uma necessidade
expressiva.
Ex.: "Todos
nus e da cor da treva escura"; "Vi
claramente visto" (Luís de Camões).
POLISSEMIA - Capacidade da linguagem para
reunir numa palavra diversos sentidos. A
diversidade de significados deriva de
vários factores linguístico-culturais,
tais como a homonímia, a sinonímia, a
convergência de étimos, a evolução
semântica, os empréstimos linguísticos e a
linguagem figurada. Esta capacidade
polissémica da linguagem permite jogos de
palavras e trocadilhos no âmbito da
ambiguidade e da conotação.
POLISSÍNDETO - Emprego repetido das
conjunções a ligar as frases coordenadas.
Ex.: "Tudo é
seco e mudo e de mestura/Também
mudando-m'eu fiz doutras cores" (Sá de
Miranda).
PROLEPSE - Antecipação, relativamente ao
presente do discurso narrativo, da narração ou da
referência narrativa a eventos e situações
que ocorrem ulteriormente na história.
PROSÓDIA - V. MÉTRICA.
topo
PROSOPOPEIA - Atribuição de características
humanas a tudo o que não seja humano
(objectos inanimados, animais, coisas
concretas, noções abstractas e
colectivas).
Ex.: "Cobiça,
a da boca aberta!" (Sá de Miranda); "Ó
vento, ó noite, dizei-lhes/Diz-lhes tu,
canção..." (Manuel Alegre); "Suaves
cabelos de pena tem a brisa" (Sophia de
Mello Breyner Andresen).
RECONHECIMENTO - V. ANAGNÓRISE.
REDUNDÂNCIA - V. PLEONASMO.
REPETIÇÃO - Repetição de uma parte do
discurso já empregada; conhece várias
modalidades (como a ANÁFORA).
Serve a amplificação afectiva (busca-se o
consentimento afectivo do receptor).
Ex.: "Porque
os outros se mascaram mas tu não/Porque os
outros usam a virtude/(...)/Porque os
outros têm medo mas tu não" (Sophia de
Mello Breyner Andresen).
RÉPLICA - Fala dos actores em cena.
RESUMO - Toda a forma de contracção da
história, de tal modo que o tempo desta
aparece reduzido no discurso.
topo
RETRATO FÍSICO - V. PERSONAGEM
- Descrição das
características físicas das personagens
(fisionomia, altura, raça, vestuário,
etc.).
RETRATO PSICOLÓGICO - V. PERSONAGEM
- Descrição das
características morais, temperamentais,
etc., das personagens.
RETRATO SOCIAL - V. PERSONAGEM
- Descrição no
plano psicológico-moral e sociológico das
personagens (a alcoviteira, o avarento, o
aristocrata, o operário, o
pequeno-burguês, etc.), geralmente de
personagens planas ou tipos
cujo comportamento está em coerência com
determinados elementos característicos
básicos.
RIMA - Homofonia ou conformidade de
sons entre dois ou mais versos;
ocorre geralmente em final de verso. Não é
um elemento essencial do verso, que pode
dispensá-la, designando-se nesse caso verso
branco. Se definirmos a rima como a
correspondência de sons, verificamos que
ela também pode existir na prosa. Pela
rima, as palavras entram em relação (de
conexão ou contraste). Podemos distinguir
rimas ricas e rimas pobres (consoante se
correspondem sons vocálicos e
consonânticos, a categoria das palavras
que rimam, etc.); rimas emparelhadas,
cruzadas, interpoladas (conforme a posição
da rima na sequência de versos duma estrofe). A rima é
interior, se uma (ou ambas) das palavras
que a asseguram está no interior do verso;
encadeada, se rimar a última palavra do
verso com o meio do verso seguinte.
topo
RITMO - O ritmo está relacionado com a
noção de "medida",
dependendo da combinação de unidades
diversas ou semelhantes, ou da linha de
entoação que resulta de uma sequência de
tons, definindo um tempo ou cadência. É
assim determinado pelo tom, pela duração
dos sons, pela acentuação e pela
frequência das recorrências, não se
circunscrevendo ao discurso versificado.
Se considerarmos este último, o ritmo
depende sobretudo da medida e do acento
dos versos.
ROMANCE - Narrativa de grande
complexidade e variedade de técnica
narrativa, frequentemente com estudo
psicológico das personagens e introdução
de episódios autónomos (micronarrativas),
reflectindo a atmosfera psicossocial da
época em que se insere.
ROMANCE
ABERTO - V. NARRATIVA
ABERTA.
ROMANCE
FECHADO - V. NARRATIVA
FECHADA.
ROMANCEIRO - Poesia Portuguesa e espanhola
de carácter épico, anónima, destinada ao
canto e transmitida por tradição oral,
durante a Idade Média. Compilação desses
poemas tradicionais, os romances.
SEQUÊNCIA - Unidade narrativa superior que
resulta da organização de unidades
narrativas mínimas, intuitivamente
reconhecidas pelo leitor, em ciclos
finitos. «A sequência inicia-se quando um
dos seus termos não tem antecedente
solidário e fecha-se quando outro dos seus
termos deixa de ter consequente» (Roland
Barthes). A organização sequencial pode
configurar-se sob a forma de encadeamento
(cf. ENCADEAMENTO),
encaixe (cf. ENCAIXE)
e alternância
(cf. ALTERNÂNCIA).
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SINCRONIA - Simultaneidade. Aplicada à
evolução da língua ou à dos fenómenos
literários, este conceito implica a
consideração de características comuns a
uma dada época.
SINÉDOQUE - Caso particular da metonímia.
Designa: a) o mais restrito pelo
mais lato, isto é, a espécie pelo género,
a parte pelo todo, o singular pelo plural;
b) o mais lato pelo mais restrito,
isto é, o género pela espécie, o todo pela
parte, o plural pelo singular.
Ex.:
"Ocidental praia Lusitana" (Luís de
Camões).
SINESTESIA - Fusão de percepções relativas
a dados sensoriais correspondentes a
sentidos diferentes.
Ex.: "(...)
aves que gritam/em bebedeiras de azul"
(António Gedeão); "E de uma padaria
exala-se, ainda quente,/Um cheiro salutar
e honesto a pão do forno" (Cesário Verde).
SONETO - Composição poética de catorze
versos, dispostos em
duas quadras e dois tercetos. O primeiro
grande poeta que o cultivou foi Dante, mas
foi Petrarca que o fixou, estrutural e
tematicamente. Introduzido em Espanha pelo
marquês de Santillana (1398-1458) e em
Portugal por Sá de Miranda (1495-1558). O
último verso do soneto, porque encerrava o
conceito fundamental, constituía a "chave
de ouro". O metro mais utilizado no soneto
é o decassílabo.
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SUMÁRIO - V. RESUMO.
TEMA - Ideia ou conceito, com
carácter universal, normalmente definido
por um nome abstracto (o amor, a saudade,
o ciúme, etc.), desenvolvido num discurso.
TEMPO DA HISTÓRIA - O tempo propriamente dito,
sucessão cronológica de eventos
susceptíveis de serem datados. É um tempo
múltiplo vivido individualmente por várias
personagens, em locais diversos.
TEMPO DO DISCURSO - A representação narrativa do
tempo da história. A multiplicidade do tempo da
história é seleccionada pelo narrador, que
estabelece prioridades, pela
impossibilidade de respeitar ao nível do
discurso a pluralidade do tempo da
história. O tempo do discurso implica
noções como ordem temporal (anacronias)
duração (pausa, elipse,
cena, sumário e resumo) e frequência
(apresentação de acontecimentos num
registo singulativo, repetitivo e
iterativo).
TEMPO HISTÓRICO - O tempo da História evocado
pela acção do romance, em muito
influenciado por contextos
periodológicos: a atracção pela Idade
Média, nas obras dos românticos, o
interesse pela Revolução Industrial, no
romance naturalista, etc.
TEMPO
PSICOLÓGICO -
O tempo filtrado pelas vivências
psicológicas das personagens. Constitui
também o referencial da mudança operada
nas personagens: o desgaste que sobre elas
provoca a passagem do tempo.
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TENÇÃO - Poema medieval de origem
provençal: cantiga
composta por dois trovadores que, em estrofes alternadas,
obedecendo ao mesmo esquema estrófico e
métrico-rimático, debatem um tema. Estes
poemas dialogados acolhem temática amorosa
e de qualquer outra índole (política,
moral, etc.), podendo conhecer esta um
desenvolvimento satírico e jocoso.
TEXTO ARGUMENTATIVO - Texto que apresenta a defesa
de um raciocínio, de uma opinião.
Destina-se a um receptor bem definido e a
sua finalidade prática é convencer o
destinatário, leitor ou ouvinte.
TEXTO DRAMÁTICO - Orientado para a representação
(cf. DRAMA).
TEXTO
LÍRICO -
Orientado para a expressão do "eu", com
predominância de comunicação de
sentimentos, assentando numa fusão do
mundo exterior e do interior. Há um
investimento particular do sujeito na
enunciação, que faz com que a experiência
aludida se torne inseparável da linguagem
que a anuncia, para o que normalmente
contribui de forma decisiva o ritmo do
discurso. É um importante património da
Literatura Portuguesa.
TEXTO NARRATIVO - Orientado para a terceira
pessoa, com o recurso a descrições,
conta/narra uma história. Narrativa é um
termo polissémico que tanto pode designar
o género literário
épico ou narrativo que inclui a epopeia, o romance, a novela, o conto, a fábula, etc., como o
discurso de uma personagem
que conta uma história, ou ainda, "aquilo
que o romance conta". A técnica narrativa
pressupõe um acontecimento que é narrado,
um público a quem se narra e um
intermediário entre ambos, o narrador.
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TIPO - V. RETRATO
SOCIAL.
TRAGÉDIA - Associada na origem, na
Grécia, a celebrações dionisíacas,
definiu-se como espectáculo dramático que,
na acepção aristotélica, representa uma acção de carácter
elevado, implicando personagens como
deuses, heróis,
reis, que se desdobrem numa teia de
eventos urdida por um destino inelutável,
inspirando sentimentos de temor, terror ou
piedade (cf. CATARSE).
TRAGICOMÉDIA - Nome que designa, entre os
séculos XVI e XVIII, a peça híbrida que
combina elementos da tragédia,
como o tema e as
personagens, e da comédia,
como os incidentes e o desfecho. Com o
advento da teoria romântica da
miscigenação dos géneros,
passou a receber a designação de drama.
VERSO - Expressão rítmica da linguagem
verbal. Significava em latim a volta da
charrua ao fim de um sulco, o movimento de
ir e vir do lavrador ao arar o campo;
depois, por extensão, o próprio sulco.
Passou a designar metaforicamente linha de
escrita, depois, linha escrita de poesia,
constituída por um determinado número de
pés ("medidas" que
correspondem a unidades constituídas por
variadas combinações de sílabas longas ou
breves). Como sucede nas outras línguas
românicas, o verso português é silábico,
isto é, entende-se como um estrutura
constituída por unidades articulatórias,
as sílabas, em número regular, sendo
também marcada por determinados acentos.
Nas línguas românicas contam-se as sílabas
até ao último acento tónico. O ritmo do
verso depende do número de sílabas, da
acentuação e eventualmente das pausas e
das rimas que nele
existam.
VILANCETE - poema lírico da época do Cancioneiro
Geral de Garcia de Resende, muito
cultivado no século XVI e ainda no
Barroco. Compõe-se de um mote (a matriz do
poema), de dois ou três versos,
seguido de um número variável de estrofes ou voltas,
em que se desenvolve o tema
apresentado no mote, repetindo cada uma
delas, a terminar, textualmente ou com
variações, o último ou os dois últimos
versos do mote. Todas as voltas são
obrigadas ao mesmo esquema estrófico.
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